Reequilibrar o seu portfólio

O foco de um investidor de longo prazo poderá não se resumir apenas a construir um portfólio adequado aos seus objetivos e esperar que os tão aclamados juros compostos comecem a funcionar a seu favor. Isto, claro, se o investidor pretende levar uma vida minimamente estável ao conseguir controlar o risco a que está exposto nos seus investimentos e, talvez, potenciar os seus retornos.

Com isto, pretendemos realçar que, por vezes, não basta investir sob o princípio de “set it and forget it”, mas que será necessário reequilibrar, periodicamente, o seu portfólio, de modo a conseguir manter a sua alocação de ativos, ajustada ao seu perfil de risco.

Antes de reequilíbrio, vamos falar de equilíbrio

Se está a começar a investir, uma parte crucial que deve entender é a importância de refletir sobre quais são os ativos com os quais se sente confortável, e quanto irá alocar a cada um destes. Assim, irá construir um portfólio diversificado de forma a minimizar os riscos. 

Imaginemos que decide investir 50% em ações e 50% em obrigações. De facto, existe evidência que as duas classes de ativos estão negativamente correlacionadas, isto é, quando o mercado de ações está em queda, as obrigações têm uma melhor performance. Desta forma, diminui o seu risco e consegue obter um rendimento mais ou menos estável.

No entanto, se o seu objetivo é obter um maior retorno, então deverá ter uma maior alocação do seu capital para ações do que obrigações como, por exemplo, um rácio de 80/20. Para efeitos de ilustração, apresentamos em baixo o gráfico da relação risco-retorno das várias classes de ativos:

Relação risco-retorno de diferentes classes de ativos

Portanto, os primeiros fatores que deve ter em conta são o nível de retorno que pretende obter com os seus investimentos e a sua tolerância ao risco, isto é, quanto é que está disposto a perder em movimentos de curto prazo para conseguir um maior retorno no futuro. Para uma primeira noção da sua tolerância ao risco, poderá preencher este questionário simples e rápido da Vanguard.

Certifique-se também que o horizonte temporal de investimento está alinhado com estes dois fatores. Por exemplo, uma estratégia de longo prazo propicia o investimento em ativos com mais risco dado que, mesmo com as dinâmicas de incerteza da economia e uma possível quebra do mercado, é provável que o mercado recupere em seu favor. 

Claramente, relacionado com o horizonte temporal de investimento e consequente decisão de alocação de ativos, está a sua idade. O portfólio de um jovem adulto deve conter uma maior percentagem de ativos mais arriscados (como ações), dado que numa perspetiva de longo prazo, estes ativos têm tendência a ter uma melhor performance. A partir dos 45 anos,  à medida que uma pessoa envelhece, a percentagem de ações deverá diminuir e a de obrigações aumentar, já que nesses momentos da vida, poderá haver uma maior necessidade de liquidez e o horizonte temporal já não é tão longo.

Existem muitos outros fatores dinâmicos a considerar, que dependerão de mudanças no seu estilo de vida, e que afetam a forma como lida com o risco:

  • Planeia comprar casa num futuro próximo – deve ser mais conservador e alocar mais capital a obrigações do que ações, para que possa ter dinheiro disponível para a entrada da casa.
  • Divorciou-se e não está responsável pela pensão de alimentos – deve adotar um comportamento mais agressivo e tomar risco ao alocar mais capital a ações.
  • Tem a faculdade e as despesas dos seus filhos para pagar – adote um comportamento mais conservador pois irá necessitar de liquidez todos os meses. 
  • Recebeu uma herança que não esperava – deve investir em ativos com mais risco, já que são fundos a entrar na sua carteira que não são necessários para despesas mensais.
  • Encontra-se com uma doença grave – necessita de liquidez para cobrir todas as despesas médicas e, por isso, ativos com menor risco são mais recomendados.

Acreditamos que, a este ponto do artigo, o leitor já compreendeu os fatores que afetam a seleção dos ativos e a proporção do capital que irá alocar a cada um. Cabe agora ao leitor perceber todos os fatores de influência, tanto no seu quotidiano, como nos seus planos futuros, para além do seu perfil de investidor, e cruzar a informação de forma a definir a sua estratégia. 

Por exemplo, teoricamente, um investidor de 20 anos racional deveria alocar 100% do seu capital no mercado de ações, já que beneficiaria da sua melhor performance no longo prazo. No entanto, se é um investidor que não aguenta a volatilidade dos movimentos de curto prazo (que pode ser considerável), sem entrar em pânico e vender todo o seu portfólio, então deve reduzir esta percentagem.

Desta forma, acreditamos também que o leitor irá compreender melhor as dinâmicas de reequilíbrio do portfólio e porque é que deve fazê-lo. 

O que significa “reequilibrar o portfólio”?

Continuemos com o mesmo exemplo de um portfólio com uma proporção igual de ações e obrigações. Se, num espaço de um ano, as ações do seu portfólio manifestarem uma boa performance, enquanto que as obrigações perderam alguma da sua valorização, o resultado será um portfólio desequilibrado tendo em conta a alocação inicial. Por exemplo, neste caso, as ações poderão passar a ter um peso de 70%, o que não é desejável. 

Com este exemplo, o leitor consegue perceber que, mesmo com uma estratégia de investimento passiva a longo prazo, será necessário algum tipo de manutenção periódica, tal como quando se faz uma consulta de rotina no médico.

Desta forma, reequilibrar o seu portfólio é nada mais do que realinhar a proporção de cada um dos ativos que compõem o portfólio, sempre que for necessário (iremos analisar, posteriormente, quando o deve fazer). Isto poderá ser feito vendendo os ativos em excesso e comprando os ativos em falta até voltar às proporções desejadas. 

Como pode concluir, o conceito de reequilibrar é bastante simples e poderá ser facilmente feito por qualquer investidor. No entanto, o momento e a frequência com que o faz trazem alguma estratégia e perspicácia ao processo.

Porque é que deve reequilibrar o seu portfólio?

O primeiro benefício já lhe foi apresentado ao longo do artigo: permitir que mantenha a sua  alocação inicial, de acordo com o seu perfil de investidor. No entanto, nós compreendemos que poderá ainda não estar convencido. De facto, quem quereria vender um ativo que está num mercado em alta? 

A natureza humana pressiona-nos constantemente para vendermos antes que o mercado quebre ainda mais, e para comprarmos quando o mercado está ao rubro e, assim, fugirmos do tormento do sentimento FOMO (Fear Of Missing Out)

Repare que isto é completamente o oposto da tão famosa estratégia de “comprar barato, vender caro”. Deste modo, o segundo imediato benefício do reequilíbrio de um portfólio é forçá-lo a contrariar a sua natureza e mantê-lo na direção certa, ao permitir que não esteja demasiado exposto a um mercado quando este está prestes a quebrar. Deste modo, irá conseguir realizar os lucros de investimentos que apresentaram uma boa performance e comprar os outros ativos em desconto. 

Para além disto, quando comparado com uma estratégia de “set it and forget it”, fazer este reequilíbrio poderá aumentar os seus retornos (embora não seja uma diferença substancial), desde que o faça com duas ou três classes de ativos que têm retornos similares no longo prazo. Um exemplo será um portfólio com fundos de empresas de baixa capitalização, de mercados emergentes e REITs. Neste caso, ao vender os ativos com alta valorização e comprar os ativos em desconto, aumenta o retorno dado que, historicamente, estes últimos providenciam o mesmo retorno.

Finalmente, queremos deixar claro que não nos referimos a fazer um completo reequilíbrio do portfólio, mas apenas de vender entre 5% a 10% do seu portfólio, periodicamente. Portanto, quando se sentir reticente quanto ao conceito, pense que representa uma porção pequena dos seus investimentos. Poderá apenas necessitar de um reequilíbrio mais significativo se existir alguma mudança no estilo de vida como mencionámos anteriormente.

Com que frequência deve reequilibrar o seu portfólio?

Tendo em conta a sua preferência, pode adotar uma destas três estratégias seguintes:

  1. De acordo com uma certa periodicidade

Para o fazer disciplinadamente, deve escolher uma periodicidade para analisar o seu portfólio, quer seja mensal, trimestral, semestral ou até anual. Não precisa de se preocupar em analisar o seu portfólio muito regularmente. Repare, é bastante improvável que, num ano, possam ocorrer grandes movimentos no mercado que desviem a alocação drasticamente. Portanto, uma revisão semestral ou anual será mais adequada.

No entanto, um estudo da Vanguard comprovou que o fator periodicidade não acarreta diferenças significativas nos retornos ajustados ao risco.

Por um lado, este simples método permite-lhe remover as suas emoções da equação e, assim, desviar a atenção de flutuações de mercado extremas de curto prazo para mudanças mais amplas do seu portfólio. Por outro lado, poderá perder tempo e dinheiro quando respeita a sua periodicidade, mas reequilibra o portfólio sem que seja necessário. De facto, se ocorrer um desvio de 1% em relação ao planeado, acredita que é necessário o ajuste? Lembre-se dos custos de transação associados.

  1. Impondo, como limite, uma certa percentagem de desvio do equilíbrio definido

Outro método para este exercício é decidir o limite de percentagem de desvio do equilíbrio definido com o qual se sente confortável. Desta forma, sempre que o limite for atingido fará o reequilíbrio.

Existem dois benefícios desta estratégia: (1) tal como definir uma periodicidade, permite-lhe remover as suas emoções do processo de decisão; (2) a estratégia é baseada na performance real das classes de ativos e não apenas numa periodicidade, que é vista como uma decisão arbitrária.

  1. De acordo com uma certa periodicidade, mas apenas se atingir o limite imposto

Esta é uma combinação da primeira e segunda estratégia. A Vanguard recomenda verificar o seu portfólio semestralmente ou anualmente, e estabelecer um limite de 5% de desvio, de forma a minimizar os custos ao mesmo tempo que gere o risco.

Como deve reequilibrar o seu portfólio?

Depois de determinar o seu objetivo em relação à proporção de alocação de ativos, o processo de reequilíbrio é bastante simples e direto. Primeiro, terá de identificar as classes de ativos que se desviaram do seu objetivo (geralmente, pode consultar o valor dos seus investimentos por classe de ativos na App da sua corretora). Apresentamos, em seguida, uma sugestão de como facilmente se pode organizar:

Fonte: adaptado de MoneyUnder30.com

 A seguir, através da sua corretora, apenas necessita de vender os investimentos em classes de ativos com peso a mais no seu portfólio (até estes alcançarem a proporção pretendida) e usar os rendimentos dessa venda para comprar os ativos que apresentam uma percentagem abaixo do objetivo.

No entanto, poderá perguntar-se “dentro de uma classe de ativos, quais devo vender?”. Deve começar por: (1) ativos que se possam ter tornado demasiado arriscados para a sua tolerância (por exemplo, uma obrigação cuja notação de risco de crédito diminuiu); (2) ativos que não tiveram uma boa performance, nem em relação ao benchmark, nem em relação às suas expectativas (por exemplo, uma obrigação que não está a cobrir o ritmo de inflação); (3) ativos cujo futuro não lhe parece promissor; (4) Qualquer outro aspeto que possa ter alterado e que o faça sentir mais inseguro. Se não identificar nenhum, venda o ativo cujo a corretora cobra menos custos de transação.

Em relação à compra, deve investir nos ativos que já possui no seu portfólio após a venda ou procurar novos ativos/novas tendências que se possam alinhar com os seus objetivos de investimentos.

Não quero perder tempo a reequilibrar o portfólio. O que posso fazer?

Todo o conceito de alocação de ativos e reequilíbrio do portfólio baseia-se numa estratégia de investimento que não só visa maximizar o retorno, mas também pretende gerir o risco. Este último componente é importante apenas para pessoas avessas ao risco ou que se aproximam da idade da reforma, pois já não têm tempo de recuperar de uma possível quebra do mercado e a liquidez imediata da venda de ativos poderá ser bastante útil. 

Deste modo, se é um investidor cujos objetivos apontam para a maximização do retorno e sem qualquer sentimento de receio quanto ao risco que isso possa acarretar, então não se deve preocupar com reequilibrar o seu portfólio. De facto, um estudo da Vanguard demonstra que uma pessoa que aloque 60% em ações (sem reequilibrar), termina com um peso de 84% e, portanto, com uma volatilidade 2,5% acima (comparado com um investidor que faça o reequilíbrio) e retornos anualizados superiores em, aproximadamente, 0,5%.

Para além disto, embora reduzido, o reequilíbrio do portfólio pode ocupar-lhe o seu pensamento e alguma parte do seu tempo mais do que desejaria. Existem opções de investimento que lhe permitem não se preocupar com este aspeto:

  1. Investimento em fundos cujo reequilíbrio é automático;
  2. Investimento em fundos geridos automaticamente por conselheiros robô (pode consultar aqui uma lista dos robôs disponíveis em vários países da Europa);
  3. Pode contratar um consultor financeiro para gerir os seus investimentos por si.

Conclusão

Como podemos concluir, reequilibrar o portfólio não é um componente importante da sua estratégia de investimento quando visa maximizar os retornos, mas sim para quem considera essencial a gestão de risco. 

Desta forma, deve refletir se faz sentido implementá-lo. Se o leitor for um pouco mais impulsivo em relação aos movimentos de curto prazo, as consequências de não reequilibrar o portfólio poderão ser devastadoras para os seus retornos, já que entrar em pânico e vender o seu portfólio é uma das principais razões pela qual não conseguirá atingir os seus objetivos. Assim, este mecanismo irá forçá-lo a contrariar a sua natureza e mantê-lo na direção certa, ao permitir que não esteja demasiado exposto ao risco.

Para além disso, é necessário considerar a sua idade, e quaisquer outros fatores que afetem  o seu orçamento mensal e/ou a sua tolerância ao risco.

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