Os 8 mitos do empreendedorismo

O empreendedorismo é uma área que tem angariado bastante interesse pela sociedade, ano após ano. As ideias viajam cada vez mais rápido, os fundos de investimento em startups têm mais capital para gerir, e os custos de criar um negócio têm decrescido. 

Tudo isto culmina num crescimento exponencial do número de startups a serem criadas todos os anos. E, neste último ano, os despedimentos advindos da pandemia levaram as pessoas a quererem criar o seu próprio negócio e, por isso, novos recordes foram alcançados.

Seja por uma ideia inovadora, pela busca de um novo estilo de vida, pelo desafio que é criar e desenvolver um negócio, ou por outra razão qualquer, provavelmente, já lhe ocorreu que deveria dar o primeiro passo no mundo do empreendedorismo.

Hoje em dia, criar um negócio é fácil. No entanto, a dificuldade de o desenvolver mantém-se e, por isso, é uma grande decisão na sua vida. É um enorme desafio físico e emocional que requer esforço, coragem, confiança, motivação e disciplina. E, dadas as estatísticas, as probabilidades não estão do seu lado.

Em cima disto,  vários mitos circulam diariamente que podem desencorajá-lo a começar um negócio, e outros que, pelo contrário, podem incentivá-lo a dar o próximo passo. Qualquer um destes é bastante perigoso e prejudicial para as suas decisões, especialmente neste ambiente que envolve um risco significativo. 

Desta forma, todas as pessoas que pensam empreender no futuro devem examinar todos os aspetos sobre a área. Vamos, então, ao longo deste artigo, “tirar a limpo” sobre o que deve acreditar ou não, e desmistificar os 8 principais mitos.

Os empreendedores nascem assim

Muitas pessoas acreditam que os empreendedores nascem com o talento natural para criar e desenvolver um negócio, isto é, nascem com as aptidões necessárias para saber negociar, vender e lidar com todos os problemas que surjam. Ora, isto parece bastante improvável.

De facto, estudos demonstram que não existem características pessoais exatamente adequadas para torná-lo um empreendedor de sucesso. Tímido ou extrovertido, corajoso ou receoso, mais orientado para os detalhes ou com uma visão geral, todos podem desenvolver as aptidões necessárias.

Claramente, o know-how do empreendedorismo pode ser aprendido por qualquer pessoa, senão, porque existiriam cursos e unidades curriculares de empreendedorismo nas universidades? Atualmente, o empreendedorismo está a ser ensinado com sucesso!

Relacionado com este tópico, está a genética. Observamos alguns casos em que os filhos se tornam empreendedores tal como os seus pais, mas a razão por detrás não é, certamente, que herdaram o gosto e o “jeito” para o empreendedorismo. Provavelmente, a sua educação levou-os a adquirir mais rapidamente as aptidões necessárias mas o resto virá do esforço e resiliência da própria pessoa.

No entanto, devemos admitir que nem todos têm a mentalidade, disposição ou motivação para criar e desenvolver um negócio, e que existem pessoas com uma maior destreza e melhor poder de adaptação às exigências que englobam o papel de empreendedor.

Independentemente disso, não deixamos de sublinhar que qualquer pessoa está apta para o empreendedorismo, se tiver a mentalidade certa.

O empreendedorismo é para os jovens

Por culpa do foco da cobertura da imprensa em volta dos jovens que criam negócios, desistem da faculdade e ficam milionários, poderá pensar que este é o caminho normal dos empreendedores, e até sentir a pressão para começar imediatamente a desenvolver uma ideia.

Em boa verdade, a maioria dos empreendedores atinge o sucesso numa fase mais tardia da sua vida, sendo os 40 anos a idade média dos empreendedores nos Estados Unidos da América. Portanto, estes dados permitem-nos concluir que o Mark Zuckerberg não é uma regra, mas sim uma exceção a esta.

Portanto, é muito importante clarificar, especialmente ao jovem leitor, que é completamente natural não ter ainda criado um negócio multimilionário. Pense comigo, é altamente improvável que um estudante já tenha todo o conhecimento, confiança e capacidades para criar uma empresa. Para além disso, estudos demonstram que a probabilidade de sucesso de um empreendedor aumenta com a sua idade, estando principalmente relacionado com a experiência adquirida e o alargamento da sua network.

Tudo o que preciso para empreender é de uma ideia inovadora

Acerca deste terceiro ponto, pergunto-lhe quantas vezes já ouviu um familiar ou um amigo dizer-lhe: “eu gostava de empreender… só me falta uma ideia… uma ideia completamente nova, fantástica e inovadora”.

Esta perceção, de que é necessária uma ideia brilhante e única para ser um bom empreendedor, está errada em dois sentidos. 

Primeiro, porque mais importante que uma ideia com bastante potencial é concretizá-la, e isso engloba delinear um plano, uma boa liderança, execução eficaz de toda a equipa, e adoção por parte do mercado, entre outros fatores. Por exemplo, em 2012, a Google ($GOOGL) lançou para o mercado o Google Glass, um dispositivo com o formato de uns óculos, que disponibilizava uma pequena tela acima do campo de visão com algumas das funcionalidades de um smartphone, como a previsão do tempo, mapas, chamadas, música, etc. Era, realmente, um produto disruptivo, mas que não conseguiu obter a correspondente adoção do mercado, já que foram reportadas várias falhas no produto.

Segundo, um empreendedor não é apenas aquele que inventa algo novo. Empreendedorismo é sobre identificar problemas e encontrar soluções, para poder criar valor na sociedade. Portanto, servir os clientes melhor que a competição pode ser a sua melhor oportunidade. Vejamos o exemplo da Uber ($UBER) e da Bolt. Enquanto a Uber foi fundada em 2009, a Bolt apenas apareceu em 2013 e, por isso, questiono-lhe: os fundadores da Bolt não são empreendedores? Claro que são!

Para além disso, nesta análise, o empreendedor deve considerar que existem vantagens de ser pioneiro no mercado, mas também de entrar mais tarde:

“Já tenho a ideia, estou só à espera do momento certo”

Outro mito que já deve ter ouvido é que existe um momento certo para começar o seu negócio, mas esse momento parece nunca chegar. E o mais provável é que nunca chegará.

A verdade é que, normalmente, irá sempre parecer-lhe que não está completamente preparado, que existe algo mais para aprender antes de começar e que as condições de mercado não são as mais favoráveis. Deve planear e tomar passos pequenos e, por vezes, será melhor esperar por prosperidade económica (como, por exemplo, nos tempos que vivemos de pandemia), mas, repare, se não atuar, não conseguirá atingir os seus objetivos.

Muitos negócios de sucesso foram criados durante crises económicas. Exemplos desses são: (1) Netflix ($NFLX), fundada em 1997, sofreu das condições precárias da bolha da internet; (2) Airbnb ($ABNB), fundada em 2008, durante a crise da bolha do mercado imobiliário; (3) Microsoft ($MSFT), fundada em 1975, num período de estagflação; (4) Disney ($DIS), fundada em 1929, durante a Grande Depressão. 

Durante recessões, as startups conseguem adaptar-se mais rapidamente, identificar problemas que necessitam de uma solução, encontrar pessoas com bastante talento que as grandes empresas despedem por não terem recursos suficientes para as sustentar, e, já que todas as recessões acabam, as startups são as empresas mais aptas a prosperar, recebendo o financiamento de investidores num mercado em alta. Estas são as razões pelas quais empreender em tempos de recessão pode ser uma vantagem, e mais uma prova de que não existe o momento certo para começar.

Muito do que necessita de saber só irá aprender com os erros e dificuldades que surjam à medida que o seu negócio ganha vida. Portanto, logicamente, quanto mais cedo começar, mais cedo irá construir um negócio rentável e sustentável.

O empreendedorismo é só para os ricos

Uma outra ideia que pode impedir as pessoas de empreender é que, para o fazer, é necessário um enorme montante de capital e que, portanto, se não for filho de pais ricos, então será impossível fazê-lo. Isto está completamente errado. Aliás, um bom empreendedor é aquele que tem de gerir os recursos limitados a que tem acesso e, mesmo assim, consegue ter sucesso no desenvolvimento do seu negócio. E isso é o que faz o empreendedorismo ser tão recompensador.

Claro que devemos admitir que não consegue construir um negócio sem nenhum capital nas suas mãos. De facto, existem vários negócios que podem ser criados a baixo custo no Shopify, mas depois terá de considerar os custos consideráveis com o marketing, por exemplo, no Facebook Ads.

Vamos ser realistas, inicialmente, não terá acesso a financiamento dos bancos através da sua empresa e, provavelmente, será difícil contactar investidores de capital de risco. Terá de aceder aos seus fundos, e pedir aos seus amigos e família para confiarem em si e o ajudarem neste desafio. No entanto, tem de considerar as seguintes opções para financiar o seu negócio: 

Bootstrapping

Desenvolva um negócio que é financiado pelos fluxos de caixa que gera. Apresentamos 3 possíveis modelos: (1) modelo de subscrição, onde o cliente subscreve um serviço periodicamente (ex: modelo dos jornais online); (2) modelo de escassez, onde vende produtos escassos a um preço mais elevado do que comprou (ex: vender sapatilhas da Nike ($NKE); (3) modelo matchmaker – quando uma entidade contrata os seus serviços.

Crédito pessoal

Apesar de, numa fase inicial, os bancos não emprestarem dinheiro à empresa que ainda não gera fluxos de caixa, poderá pedir um empréstimo pessoal contra alguma garantia (se necessário). De facto, foi como Jeff Bezos começou por financiar a Amazon ($AMZN).

Crowdfunding

Método de financiamento, onde coleta pequenas contribuições de muitas pessoas, através de plataformas online (como a Kickstarter ou a Indiegogo, para financiar a sua empresa

Investidores anjo

Indivíduos com um grande património, que podem ajudá-lo, não só em termos financeiros, mas também com os seus conselhos e contactos (maioritariamente, estes investidores já foram empreendedores).

Incubadoras e aceleradoras

Oferecem programas de assistência e financiamento às startups (ex: Acredita Portugal).

Como pode concluir, com a acesso a um elevado montante de capital ou não, existem várias opções para construir e desenvolver o seu negócio.

Os empreendedores nunca desistem

Esta ideia de que os empreendedores nunca desistem é bastante ilusória. Realmente, os empreendedores têm de ser resilientes e lutar até conseguirem ultrapassar todos os obstáculos, mas também têm de saber aceitar o fracasso da sua ideia como um possível resultado final. De facto, estudos mostram que as probabilidades não estão do seu lado. 

Se o negócio não está a ir na direção que deseja, o melhor que tem a fazer é minimizar os danos e liquidar os ativos para recuperar parte do seu investimento. Desta forma, simplesmente tem de aprender a aceitar a derrota e não voltar a cometer os mesmos erros.

Portanto, é completamente natural que muitas das suas ideias não resultem, até que finalmente encontra uma que tem “pernas para andar”. Desta forma, desistir de uma ideia que não resulta pode parecer, para a maioria das pessoas, um completo fracasso na sua vida. Porém, aos olhos de um empreendedor, é uma componente que faz parte do seu percurso. Tal como diz a expressão popular: “quando se fecha uma porta, outra porta abre-se.”

Existem vários exemplos de empresas que não tiveram sucesso com a sua primeira ideia: (1) a Apple ($AAPL) começou por desenvolver serviços de tecnologia para a educação, mais especificamente, ferramentas para professores e uma interface para pessoas que não sabiam programar; (2) Stewart Butterfield criou, em 2002, a Ludicorp, para desenvolver o jogo Game Neverending, mas, como não teve sucesso, criou a Flickr; (3) mais tarde, em 2009, Butterfield tentou outra vez criar um jogo (chamado Glitch) pela sua empresa Tiny Speck que, novamente, não resultou e, portanto, criou o Slack.

Os empreendedores têm de saber e fazer tudo

O mundo do empreendedorismo é muito exigente em termos de tempo e esforço mental por parte do fundador da startup. No entanto, não é, de todo, um mundo onde o empreendedor deva fazer tudo sozinho.

Para ser um bom empreendedor, é também necessário saber colaborar, trabalhar em equipa e saber ouvir. Especialmente as pessoas mais inexperientes na área irão beneficiar ao estabelecer uma boa rede de contactos, tanto ao receber conselhos e ouvir as histórias e experiências de quem já passou pelo processo, como também ao perceber possíveis oportunidades de crescimento do negócio. Pode ser tão simples como compartilhar uma ideia ou estratégia e saber qual é a sua opinião. Tudo irá contribuir para a sua jornada como empreendedor.

Para além disso, não conseguirá, de qualquer maneira, desenvolver o seu negócio sem delegar tarefas à sua equipa. Simplesmente, é impossível fazer tudo sozinho. É importante para a estabilidade da sua empresa trabalhar diariamente com a sua equipa, discutir ideias, e dividir as tarefas mais pequenas. 

Repare que, desta forma, terá o poder de decisão sobre as questões mais cruciais e, também, o tempo necessário para, calmamente, seguir o caminho mais acertado. Claro que, numa fase inicial, onde os recursos são escassos, o espaço de trabalho será solitário e todo o sucesso da empresa depende do seu esforço e decisões. Mas, com o tempo, deixar que os outros o ajudem no seu caminho irá salvar-lhe muita energia no seu dia-a-dia e prevenir que tenha um burnout.

Talvez ainda mais importante é o facto de que qualquer empreendedor deve estar atento ao feedback dos seus consumidores para melhorar o seu produto ou serviço. Portanto, entre mentores, equipas e clientes, vemos que o empreendedorismo não é um mundo solitário, mas sim de uma completa network.

Relacionado com isto, está a crença de que para se ser empreendedor, é necessário ter um curso superior em gestão ou empreendedorismo. Por um lado, um curso superior pode trazer-lhe vários benefícios. Por exemplo, se tiver um curso em engenharia informática será mais fácil desenvolver uma ideia para uma App. De outra forma, teria de contratar os serviços de um especialista.

Por outro lado, não é um requisito. O sucesso de um empreendedor está inteiramente ligado à sua vontade, motivação e empenho em estar inserido num ambiente de constante aprendizagem e, portanto, não é sobre o que sabe ou não sabe, mas sim sobre quão rápido consegue aprender. E, de facto, os números não mentem. Um estudo da CNBC/SurveyMonkey Small Business Survey obteve os seguintes resultados:

Fonte: CNBC

* Associate’s Degree: Programa de dois anos de preparação para a licenciatura. Apenas existe em alguns países, entre eles os Estados Unidos da América.

Como pode extrair dos resultados, apenas uma minoria, 44%, dos empreendedores inquiridos tinham um grau de ensino superior. Com isto, sublinhamos, de novo, que um curso superior não é um requisito, mas também que não será, de todo, uma má ideia obter mais conhecimentos através deste meio de aprendizagem.

Os empreendedores têm mais tempo livre

Esqueça a ideia de que empreender é ter todo o tempo livre e gerir a empresa pode ser feito através de um portátil, enquanto bebe um cocktail numa praia no Havaí. Também esqueça a ideia que, para ter sucesso, precisa de trabalhar sem descanso, dia e noite. Qualquer empreendedor sabe que a chave do sucesso é dominar a habilidade de gerir o seu tempo e, por isso, alcançar um balanço entre a vida pessoal e o trabalho. 

Portanto, desengane-se se está a pensar trocar o seu emprego de 8 horas diárias por algo muito mais flexível. No início, a realidade é que estas 8 horas podem converter-se em 12 ou até 14 horas de trabalho! A verdade é que haverá mais liberdade em certos aspetos, mas haverão outras exigências que envolvem mais sacrifícios. A principal vantagem é, de facto, poder definir o seu próprio horário de trabalho. Por exemplo, muitos empreendedores preferem esforçar-se mais durante a semana, para terem o fim-de-semana livre para a sua vida pessoal e familiar.

Para além disso, ser empreendedor para se livrar dos chefes é um completo mito. Sim, é verdade que não sofre a mesma pressão das avaliações de performance de uma empresa, e possíveis ameaças de despedimento. No entanto, a sua startup, os seus clientes, os seus investidores, todos se tornam os seus novos chefes. A sua equipa está à espera de um líder apto para lidar com os problemas que surjam, os seus clientes à espera de um produto ou serviço de qualidade, e os seus investidores à espera de ver o seu capital crescer.

Conclusão

A este ponto do artigo, enquanto alguns dos mitos possam ter parecido óbvios, acreditamos que o leitor possa estar surpreendido com algumas crenças anteriores.

Qualquer aspirante a empreendedor, deve examinar todos estes mitos e convencer-se que são apenas mitos, para que possa iniciar o seu longo caminho com uma boa mentalidade e, desta forma, livrar-se de alguns obstáculos que o possam impedir de alcançar o sucesso.

Poderá ser bastante desconcertante, mas, possivelmente, para um dia criar um negócio rentável e sustentável poderá ter de desaprender algumas coisas do que aprendeu até agora sobre empreendedorismo.

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