Mulheres vão demorar mais a recuperar emprego depois da pandemia

A pandemia COVID-19 trouxe bastantes transformações no modo como trabalhamos, não só com o uso do teletrabalho, mas também com o aumento da desigualdade de género (também em Portugal).

O impacto da pandemia na desigualdade de género (em termos económicos)

Antes da pandemia era estimado, pelo “Global Gender Gap Index 2020” do World Economic Forum, que demoraríamos 257 anos para atingir a igualdade de género económica. Esta mudança lenta foi posta em causa devido à pandemia.

A desigualdade de género pode ser medida de várias formas. Segundo as Nações Unidas para mulheres, esta é medida em termos de: violência contra mulheres, violência doméstica, saúde das mulheres, choques económicos, trabalho não pago (tarefas domésticas), mulheres jovens e meninas, conflito e migrantes. Devido à natureza do website, este artigo irá focar-se apenas nos aspetos económicos, ou seja, choques económicos e trabalho não pago.

Os choques económicos são dependentes de vários fatores: a percentagem da população em trabalho inseguro (trabalhos na economia informal, ou no setor de serviços), o desemprego, se a família é ou não monoparental e o nível de poupança.

Segundo as NU, globalmente, as mulheres são mais prováveis do que os homens de se encontrarem num emprego considerado inseguro (e que, portanto, têm menor acesso a proteções sociais), para além disto as mulheres representam a maioria das famílias monoparentais. 

Tudo isto leva a que sejam as mulheres a gastarem e a ganharem menos, em média, do que os homens. Estas circunstâncias levam a que as mulheres sejam, em média, menos capazes de absorver os choques económicos (tais como o provocado pela pandemia COVID-19) do que os homens. 

De facto, o desemprego aumentou mais para as mulheres do que para os homens. Por exemplo, nos EUA o desemprego feminino aumentou dos 2,7 milhões em fevereiro para 11,5 milhões em abril, enquanto que para os homens o desemprego aumentou dos 3,55 milhões para 11 milhões. Para além disto, a NU estima que na Ásia e Pacífico, as mulheres estejam a perder o seu sustento mais rapidamente que os homens e com menores alternativas para gerarem rendimento.

Para além disto, tem-se verificado que as mulheres têm vindo a ser sobrecarregadas com trabalho não pago. Antes da pandemia, em termos globais, segundo as NU para mulheres, as mulheres faziam 3 vezes mais trabalho não pago do que os homens. Os fechos de escolas, as medidas de distanciamento, os sistemas de saúde stretched, entre outras questões levaram ao aumento da necessidade/procura de trabalho doméstico que continuou a ser realizado maioritariamente pelo sexo feminino – mesmo quando existe trabalho pago a ser conciliado. Esta situação é mais acentuada em zonas isoladas e rurais, e estas práticas discriminatórias afetam mais severamente jovens adolescentes que (também com base em dados de passadas pandemias) se tornam mais prováveis de nunca mais voltar à escola.

Igualdade de género pós-covid?

Apesar da desigualdade acentuada durante a pandemia, poderia haver esperança de que, após esta, a situação se voltasse a normalizar. No entanto, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) diz que esse não é o caso, e que as desigualdades irão persistir após o fim da pandemia.

A OIT antecipa um défice de 13 milhões de empregos ocupados por trabalhadoras em todo o mundo, relativamente ao cenário anterior à pandemia. Isto ocorre porque durante a pandemia o emprego feminino desceu 4,2% e o masculino 3%, enquanto a OIT prevê uma recuperação em 2021 do emprego feminino de 3,3% e do masculino de 3%. Ou seja, tal como é referido pela organização, “Ainda que a taxa de crescimento de emprego projetada em 2021 para as mulheres exceda a dos homens, esta irá, apesar de tudo, ser insuficiente para trazer as mulheres de volta aos níveis de emprego pré-pandémicos”.

Assim, em 2021 é estimado que a taxa de emprego feminina global ronde os 43,2%, contra os 68,6% da taxa de emprego masculina. No caso da Europa e Ásia Central, a taxa de emprego das mulheres em idade ativa deverá ficar nos 46%, enquanto que a dos homens será cerca de 60,8%.

O que fazer?

A desigualdade de género é algo com o qual os governos se devem preocupar. Segundo um estudo da consultora McKinsey, os benefícios económicos de reduzir o gender gap são 6 a 8 vezes mais altos do que o investimento (em educação, planeamento familiar, mortalidade maternal, inclusão digital e trabalho não pago) que é necessário para o conseguir. 

Também é algo que diz respeito às empresas, até porque a igualdade de género é para elas benéfica. De acordo com outro estudo da McKinsey, a maior rentabilidade nas empresas parece estar relacionada com a diversidade. As empresas no quartil superior em diversidade das equipas executivas são 25% mais prováveis de terem uma rentabilidade acima da média, do que empresas no quarto percentil. Para além do mais, as empresas podem estar a colocar-se em desvantagem ao não promoverem a diversidade, pois podem perder “resiliência, habilidade de recuperar da crise corrente” e estariam a “limitar o seu acesso a talento, skills diversas, estilos de liderança e perspetivas”.

Deste modo, aplicar políticas gender-responsive torna-se extremamente importante.

A OIT sugere políticas que previnam as mulheres de desproporcionalmente perderem postos de trabalho e rendimentos, e políticas que melhorem a qualidade de trabalho. No primeiro caso, isto pode ser levado a cabo através de benefícios de retenção de emprego às empresas, subsídios salariais a empresas com representação igualitária de género, criação de emprego público por parte dos governos, e para as mulheres que dependem da economia informal são sugeridos benefícios extraordinários durante a pandemia (algo como o rendimento mínimo em Portugal). 

Políticas para melhorar o ambiente de trabalho das mulheres incluem: empresas que providenciem serviços de babysitting para os seus funcionários, aumento de salários durante a pandemia, maiores investimentos no combate à violência doméstica, já que esta também afeta a produtividade no trabalho, entre outras.

a McKinsey defende intervenções para reduzir o trabalho não pago, para aumentar a inclusão digital e financeira e intervenções para diminuir os biases sociais. O maior trabalho não pago realizado pelas mulheres pode ser reduzido através de políticas empresariais, como trabalho flexível ou a oferta de serviços de babysitting, entre outras. A maior inclusão digital e financeira pode passar por aumentar a infraestrutura digital (Especialmente em economias emergentes), reconhecer os biases imputados a mulheres que usam os espaços digitais, políticas para promover mulheres empreendedoras, etc. Em termos de diminuir os biases sociais, sendo este um tópico demasiado complexo, é necessário o envolvimento de todos os stakeholders no longo prazo tentando convencer a população em geral de que um maior número de mulheres na força de trabalho representa um progresso benéfico não só em termos sociais como económicos.

Conclusão

A desigualdade de género é algo que afeta a todos, não só as mulheres. Assim, é necessário reconhecer os biases e desigualdades existentes, e aplicar as medidas necessárias para os combater. 

Autora: Ana Margarida Costa

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