COVID-19 acentuou a descriminação de género em Portugal

COVID-19: Pontos-chave 

  • Globalmente, há uma disparidade média de género de 31,4% que precisa de ser eliminada.
  • No caso da igualdade nos salários portugueses por empregos semelhantes, há ainda uma disparidade de 40,2% neste aspeto.
  • As mulheres portuguesas perderam 5,5 mil milhões de euros, no ano de 2020, quando comparadas aos homens que exercem cargos idênticos
  • A desigualdade de género, já existente, aumentou drasticamente, e setores onde predominam as mulheres foram os que mais sofreram com o desemprego gerado pela pandemia.

A descriminação de género global

A igualdade de género tem sido algo difícil de atingir. Já antes da pandemia, o progresso no sentido da igualdade era bastante lento, e de acordo com o relatório “Global Gender Gap Index 2020” do World Economic Forum, vão ser precisos 257 anos até que a igualdade de género económica possa ser atingida.

Globalmente, a distância completa até à paridade total está nos 68,6%, significando que há, ainda, uma disparidade média de género de 31,4% que precisa de ser eliminada. Este resultado foi superior ao do relatório anterior, o que se traduz pelo facto de haver mais países na direção da igualdade de género (geralmente a um ritmo lento).

A diferença na remuneração entre homens e mulheres é uma forma persistente de desigualdade de género no local de trabalho, e o referido relatório refere que o progresso no sentido de eliminar esta disparidade estagnou.

O relatório conclui, ainda, que nenhum país no mundo conseguiu alcançar a paridade nos salários. De acordo com a estimativa fornecida, a média global do salário de uma mulher é de 11.000$ (em paridade do poder de compra). A de um homem, por sua vez,  é de 21.000$, quase o dobro.

Neste aspeto, a Islândia demonstra ser, pela décima primeira vez, o país com maior igualdade de género, tendo já quase eliminado 88% da disparidade. Em segundo, segue-se a Noruega, com 84,2%, seguida da Finlândia com 83,2% e da Suécia com 82%.

O impacto da pandemia na desigualdade de género global

A grande preocupação, hoje em dia, reside no facto da disparidade de género ter aumentado com a pandemia.

Uma em cada quatro mulheres, globalmente, diz que a pandemia teve um impacto negativo nas suas carreiras, de acordo com o estudo “Fidelity International’s Women and Money”.

De acordo com o novo estudo, realizado pela empresa Scottish Widows, mulheres do Reino Unido na casa dos 20 anos estão em vias de ter menos 116.000€ em poupanças para pensão ou reforma, do que os homens da mesma idade.

Esta disparidade deve-se ao facto de as mulheres terem uma maior probabilidade de receber rendimentos mais baixos, de trabalharem em part-time, ou de suspenderem a vida de trabalho para cuidar da família.

Os trabalhadores com responsabilidades parentais são mais vulneráveis a perdas de emprego ou licenças. “Working Families”, uma empresa de advocacia sem fins lucrativos, baseada no Reino Unido, indica que 85% dos pedidos de ajuda foram feitos por mulheres, em 2020.

Jen Van Zyl, chefe executiva da empresa diz que “As tarefas de cozinhar, limpar, e cuidar das crianças, estão a ser assumidas por elas, e não pelos seus parceiros, o que está a ter um grande impacto na sua capacidade de fazer o seu trabalho adequadamente e de progredir nas suas carreiras”

Adicionalmente, de acordo com o trabalho académico “Fearless Woman: Financial Literacy and Stock Market Participation”, foi confirmado que os homens tendem a ter mais literacia financeira do que as mulheres.

No estudo foram inquiridos mais de 1.500 homens e mulheres com três perguntas sobre taxas de juro, de inflação, e de diversificação de investimentos. Verificou-se que as mulheres têm menos confiança em si mesmas no que toca a assuntos financeiros.

A falta de confiança, por si só, é responsável por um terço dos níveis mais baixos de educação financeira das mulheres, em relação aos homens (segundo um artigo de uma equipa internacional da Alemanha).

A descriminação de género em Portugal

Em Portugal – dada uma medida entre 0 e 1, onde zero significa a imparidade total e 1 a igualdade total – o índice da disparidade de género é de 0,744, o que representa um progresso não muito elevado desde 2006, quando o índice era de 0,692.

Especificamente, no caso da igualdade nos salários portugueses por empregos semelhantes, o índice é de 0,598, o que significa que ainda há uma disparidade de 40,2% neste aspeto.

No ramo do poder político, em Portugal, o índice “Political empowerment” – que mede a diferença entre homens e mulheres no nível mais alto de decisão política – é de 0,278, notando-se que há ainda uma elevada disparidade, cerca de 72,2%, neste ramo.

Contudo, Portugal tem mais mulheres no governo e no parlamento do que a média da UE, contando com um índice de 0,554 neste aspeto.

O impacto da COVID-19 na desigualdade de género em Portugal

De acordo com o economista Eugénio Rosa, as mulheres portuguesas perderam 5.5 mil milhões de euros, no ano de 2020, quando comparadas aos homens que exercem cargos idênticos.

Lina Coelho, investigadora do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra refere que “As mulheres correm o risco de serem empurradas, cada vez mais, para as profissões menos valorizadas e com menor rendimento”.

Evelyn Regner, presidente da comissão dos direitos das mulheres e da igualdade de género do Parlamento Europeu, afirma que a violência doméstica aumentou pelo menos 30% na maioria dos países europeus.

Para além disso, diz que “o fardo do trabalho doméstico, que já era feito, em larga medida, por mulheres, também ganhou outras dimensões, como conciliar a telescola e o teletrabalho. E, no mercado de trabalho, eram, e são, as mulheres, as heroínas da sociedade que estão na linha da frente: 75% dos empregos com relevância sistémica são levados a cabo por mulheres, de hospitais a lares, professoras, empregadas de limpeza e lojistas”.

Adicionalmente, o estudo “Igualdade de género e as consequências socioeconómicas da crise de COVID-19”, realça que as mulheres não só tiveram mais reduções de horário do que os homens, como também estão mais em teletrabalho e trabalham mais horas não remuneradas, no apoio aos filhos. Salienta-se, ainda, que são as mulheres quem mais abdicam de trabalhar para dar assistência a dependentes (40% em comparação com 30% dos homens).

Evelyn realça, então, que a desigualdade de género, já existente, aumentou drasticamente, e que setores onde predominam as mulheres foram os que mais sofreram com o desemprego gerado pela pandemia.

Contudo, a eurodeputada destaca que a presidência portuguesa está a mostrar muita ambição na questão da igualdade de género, salientando que é “exatamente” isso que a UE “precisa agora”.

Evelyn informa, ainda, que “Estas crises podem tornar-se numa oportunidade para intensificar ações contra a violência de género. Neste aspeto, esperamos uma proposta da Comissão Europeia até ao final deste ano e, finalmente, durante esta semana, apresentaram uma diretiva para combater a diferença nos salários entre homens e mulheres”.

Promover a igualdade de género

Contudo, há evidências de que a pandemia levou os homens a inclinarem-se para as tarefas domésticas. Um relatório da Universidade de Birmingham encontrou um aumento no “número de casais que indicam que compartilharam tarefas domésticas [e] atividades de cuidado durante o bloqueio”. 

As empresas devem desempenhar um papel mais ativo para acabar com a discriminação de género. Desde que os sete princípios de empoderamento das mulheres (da ONU) foram lançados, mais de 4.000 diretores executivos comprometeram-se a promover a igualdade de género.

As empresas podem ajudar, promovendo responsabilidades domésticas e de cuidado compartilhadas, igualando e estendendo as licenças de paternidade e maternidade, aumentando o número de creches no local de trabalho e, ainda, favorecendo um trabalho mais flexível.

Combater a descriminação é importante porque a igualdade de género diz respeito a todos. Para reconstruir melhor, devemos fazê-lo de uma forma mais inclusiva em termos de género e tentar criar um mundo em que o valor de homens e mulheres conte igualmente.

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